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Por isso, urge recuperar o carácter de luz que é próprio da fé, pois, quando a
sua chama se apaga, todas as outras luzes acabam também por perder o seu vigor.
De facto, a luz da fé possui um carácter singular, sendo capaz de iluminar toda
a existência do homem. Ora, para que uma luz seja tão poderosa, não pode
dimanar de nós mesmos; tem de vir de uma fonte mais originária, deve porvir em
última análise de Deus. A fé nasce no encontro com o Deus vivo, que nos chama e
revela o seu amor: um amor que nos precede e sobre o qual podemos apoiar-nos
para construir solidamente a vida. Transformados por este amor, recebemos olhos
novos e experimentamos que há nele uma grande promessa de plenitude e se nos
abre a visão do futuro. A fé, que recebemos de Deus como dom sobrenatural,
aparece-nos como luz para a estrada orientando os nossos passos no tempo. Por
um lado, provém do passado: é a luz duma memória basilar — a da vida de Jesus
–, onde o seu amor se manifestou plenamente fiável, capaz de vencer a morte.
Mas, por outro lado e ao mesmo tempo, dado que Cristo ressuscitou e nos atrai
de além da morte, a fé é luz que vem do futuro, que descerra diante de nós
horizontes grandes e nos leva a ultrapassar o nosso « eu » isolado abrindo-o à
amplitude da comunhão. Deste modo, compreendemos que a fé não mora na
escuridão, mas é uma luz para as nossas trevas. Dante, na Divina
Comédia, depois de ter confessado diante de São Pedro a sua fé, descreve-a
como uma « centelha / que se expande depois em viva chama / e, como estrela no
céu, em mim cintila ». [4] É precisamente desta luz da fé que quero
falar, desejando que cresça a fim de iluminar o presente até se tornar estrela
que mostra os horizontes do nosso caminho, num tempo em que o homem vive
particularmente carecido de luz.