sábado, 11 de dezembro de 2010

Pregador do Papa: Resposta cristã ao cientificismo ateu. Primeira Pregação do Advento (Parte V)

5. "Tudo foi feito por meio dele"
O Natal é a ocasião ideal para voltar a propor a nós mesmos e aos demais este ideal, patrimônio comum da cristandade. É da encarnação do Verbo que os Padres gregos derivam a própria possibilidade da divinização. São Atanásio não se cansa de repetir: "O Verbo se fez homem para que pudéssemos nos tornar Deus" [19]. "Ele se encarnou e o homem tornou-se Deus, porque se uniu a Deus", escreve por sua vez São Gregório Nazianzeno [20]. Com Cristo, é restaurado ou trazido à luz aquele ser "à imagem de Deus" que é a base da superioridade do homem sobre o restante da criação.
Dizia antes como a marginalização do homem traz consigo automaticamente a marginalização de Cristo do universo e da história. Ainda sobre este ponto de vista o Natal é a antítese mais radical da visão cientificista. Sobre isso, escutaremos proclamar solenemente: "Tudo foi feito por meio dele, e sem ele nada foi feito de tudo o que existe" (Jo. 1,3); "pois é nele que foram criadas todas as coisas, tudo foi criado através dele e para ele" (Col 1,16). A Igreja assumiu essa revelação e nos faz repetir no Credo: "Per quem omnia facta sunt": Por meio dele tudo foi criado.
Ouvindo estas palavras - enquanto todos à nossa volta que não fazem mais que repetir "O mundo se explica sozinho, sem necessidade da hipótese de um criador", ou "somos frutos do acaso e da necessidade" - se dá, sem dúvida, um choque, mas é mais fácil que se produza um conversão e floresça a fé depois de um choque como esse que com uma longa argumentação apologética. A questão crucial é: seremos capazes, nós que aspiramos reevangelizar o mundo, de expandir nossa fé a essa dimensão? Nós realmente acreditamos, de todo o coração, que "todas as coisas foram feitas por meio de Cristo e em vista de Cristo"?
Em seu livro Introdução ao Cristianismo, há muitos anos, Santo Padre, escreveu:
"A segunda parte principal do Credo coloca-nos propriamente diante do elemento cristão fundamental: a crença de que o homem Jesus, um indivíduo executado na Palestina pelo ano 30, é o ‘Cristo' (ungido, escolhido) de Deus, e mais: é o próprio Filho de Deus, centro e opção de toda a história humana... Contudo, o primeiro impacto desta realidade causa escândalo ao pensamento humano: Não nos tornamos com isto vítimas de um tremendo positivismo? Será razoável agarrar-nos à palhinha de um único acontecimento histórico? Poderemos ousar fundamentar a nossa existência inteira, e até a história toda, sobre o que não passa de pobre palha de um acontecimento qualquer a boiar no grande oceano da história?" [21].
Para estas questões, Santo Padre, nós vamos responder sem hesitar, como faz o senhor nesse livro e como não se cansa de repetir hoje, na sua qualidade de Sumo Pontífice: Sim, é possível, é libertador e alegre. Não por nossas forças, mas pelo dom inestimável da fé recebemos e pela qual damos graças infinitas a Deus.
* * *
[1] Bento XVI, Motu Proprio "Ubicunque et semper".
[2] João Paulo II, Parole sull'uomo, Rizzoli, Milano 2002, p. 443; cf. anche Enc. "Fides et ratio", n. 88.
[3] J. Monod, Il caso e la necessità,  Mondadori, Milano, 1970, pag. 136-7. [Ed. original francesa: Jacques Monod, Le Hazard et la necessitéEssai sur la philosophie naturelle de la biologie moderne. Seuil, Paris 1970; English trans. Chance and Necessity. An Essay on the Natural Philosophy of Modern Biology, Vintage 1971].
[4] M. Planck, O conhecimento do mundo físico, (cit. por Timossi, op.cit.  p. 160)
[5] J.H. Newman, in The Letters and Diaries, vol. XXIV, Oxford 1973, pp. 77 s.
[6] J.H. Newman, Apologia pro vita sua, Brescia 1982, p.277
[7] J.H. Newman, Lo sviluppo della dottrina cristiana, Bologna 1967.
[8] Monod, op. cit. p. 136.
[9] P. Atkins, citado por Timossi, op. cit. p. 482.
[10] B. Pascal, Pensamentos.
[11] M. Blondel et A. Valensin, Correspondance, Aubier, Paris, 1957, p. 47.
[12] In Origene, Contra Celsum, IV, 23 (SCh 136, p.238; cf.  IV, 74 (ib. p. 366)
[13] Cf. M. Pohlenz, O homem grego, Firenze 1962.
[14] In Origene, op. cit., IV, 30 (SCh 136, p. 254).
[15] Scolii a Dionísio Areopagita in PG 4, 536; cf. Dionísio Areopagita, Lettera VI (PG, 3, 1077).
[16] G. Bardy, in Dct. Spir., III, col. 1389 s.
[17] São Leão Magno, Sermo 21, 3: CCL 138, 88 (PL 54, 192-193)
[18] Diálogo com Motovilov, em Irina Gorainoff, Serafino di Sarov, Gribaudi, Turin 1981. p. 156.
[19] S. Atanasio, J. Quasten, Patrologia, II, 22-83; Obras: PG 25-28.
[20] S. Gregorio Nazianzeno, Discursos teológicos, III, 19 (PG 36, 100A).
[21] J. Ratzinger, Introdução ao Cristianismo, Herder, São Paulo,  1970. Versão brasileira do Pe. José Wisniewski Filho, S.V.D., do original alemão Einführung in das Christentum
[Traduzido do original italiano por Márcia Ameriot]

Fonte: ZENIT