segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Este Brasil corrupto é expressão do jeito Lula de fazer política. E ele ainda acha pouco! Por Reinaldo Azevedo



Este Brasil que manda a política para a página de polícia é uma criação genuína de Luiz Inácio Lula da Silva. Não! O lulo-petismo não inventou a corrupção. Mas foi o Babalorixá de Banânia quem a transformou numa categoria de pensamento, numas das formas do “ser político”, num “fazer” supostamente respeitável, num verdadeiro “saber” que se transmite às gerações futuras. Mais perverso do que ter transformado a corrupção num método, Lula fez dela uma forma de “resistência política”, contra supostas elites que estariam a espreitar a verdadeira revolução que ele diz ter feito no Brasil.
Essa visão de mundo ganhou adeptos, gerou peroração acadêmica, contaminou o jornalismo. Não se leu há dias na imprensa uma análise segundo a qual o que falta a Barack Obama nos EUA é justamente um PMDB? A corrupção seria dotada, assim, de uma virtude saneadora, que amaina os espíritos, que arredonda as agudezas ideológicas, que faz convergir para o centro os extremos, que desarma os espíritos, que transforma a convicção que divide na conveniência que une. E se dá a isso o nome de “governabilidade”. E Lula, como veremos, se mobiliza para que a lambança tenha longa duração.
Pouco importa, nessa perspectiva, o grau de comprometimento pessoal do próprio Apedeuta com a corrupção. Interessa aqui o modelo que ele erigiu de modo meticuloso, sistemático, organizado. Ele foi o arquiteto dessa forma de exercício de poder, mas o grande engenheiro da obra, justiça se faça, foi mesmo José Dirceu. Os dois transformaram o partido que não se coligava com ninguém no partido que se une ao capeta se o rabudo, afinal de contas, aceitar fazer a genuflexão - pelo que será regiamente recompensado. É isto: o PT é o partido que seduziu o diabo; normalmente, é o chifrudo que seduz os incautos. E, antes que continue, uma nota esclarecedora à margem: eu não estou afirmando que os petistas aprenderam maus costumes na convivência com os PMDBs e PRs da vida, não! Não há nada que essa gente possa ensinar a um petista que este já não saiba de berço - refiro-me ao berço partidário. O que estou afirmando é que os petistas profissionalizariam o saque ao poder. Perto do que se tem hoje, ícones de certo modo de fazer política, como Adhemar de Barros, Paulo Maluf ou Fernando Collor, revelam-se amadores primitivos. Fim da  nota à margem. Sigamos.
A bagunça partidária brasileira e isso que chamam “presidencialismo de coalizão” facilitam o saque. Como explicar, por exemplo, a um estrangeiro que não conheça direito a realidade brasileira que o maior partido do país, o PMDB, concorreu com candidato próprio à Presidência da República uma única vez depois da redemocratização, em 1989? Não obstante, está no poder desde o fim do Regime Militar, em 1985.
Os petistas tomaram uma dura lição em 1994 e 1998. Derrotados pelo Plano Real, que combateram com unhas e dentes, entenderam que FHC teve de liderar uma coligação forte para vencer, governar e implementar a sua agenda. O PT fez uma leitura peculiar do processo. Também ele se abriria à adesão de quem quisesse aderir, mas, dado certo déficit de credibilidade no establishment político - embora contasse com amplo apoio do eleitorado -, teria de pagar um prêmio maior do que pagava “o outro lado”, o adversário. Lula venceu a disputa em 2002 e foi às compras. O principal alvo foi justamente o PMDB, que se coligara com o tucano José Serra. Essa foi a costura mais importante feita, então, por José Dirceu, o “homem forte” do regime que se iniciava ali.
Políticos antes hostis ao PT, empresários, o setor financeiro, o baixo-claro do Congresso, críticos ferrenhos do partido… Todos descobriram um Lula de uma formidável generosidade, como, de fato, nunca antes… Ele, sim, sabia negociar e fazer concessões. A conversa era franca, sem medo, com aquele pragmatismo sindical de que o líder tanto se orgulhava. Para as massas, afinal, ali chegava o redentor, o que viria mostrar o valor do povo, combater as elites etc e tal. Vocês conhecem a cascata. Tudo, então, era permitido. É evidente que o mensalão, por exemplo, não foi um desvio, uma vacilo, um erro, uma transgressão. Era um método. Não por acaso, estão envolvidos na lambança o presidente do partido, o tesoureiro, o presidente do Câmara e o chefe da Casa Civil. Até o marqueteiro de campanha foi pago com dinheiro confessadamente ilegal.
Nunca antes na história destepaiz um presidente havia sido tão generoso e, em muitos aspectos, verdadeiramente “descentralizador”. Garantida a fidelidade exigida, Lula, vamos dizer assim, liberou as “forças fisiológicas”. Cada aliado fizesse em seu feudo o que bem entendesse, atendidas algumas pequenas exigências. A conjuntura favorável - e vou me dispensar dos detalhes agora - favoreceu a consolidação do seu modelo de gestão, que persiste até agora.
Reforçando…Ontem, Lula almoçou no Palácio das Laranjeiras, no Rio, residência oficial do governador Sérgio Cabral (PMDB). Estavam presentes parlamentares, ministros e secretários estaduais e municipais de diversos partidos da base: PT, PMDB, PDT, PSB, PC do B, PSC e PRB. O Babalorixá mandou um recado: se todos estiverem unidos em 2012, ele estará no palanque. Vai ficar longe das cidades em que os partidos da base se dividirem. Como se nota, ele força a mão para que candidatos sejam verdadeiros chefes de uma arca de Noé, reunindo um pouco de tudo. Foi assim que impôs, por exemplo, que o PT do Maranhão, adversário histórico dos Sarneys, apoiasse a candidatura de Roseana ao governo do Estado.
Ora, aonde isso leva? Sob o guarda-chuva do lulo-petismo, abrigam-se, então, os mais diversos interesses. Não se constroem candidaturas com uma proposta, uma agenda, um programa, um rumo. Faz-se um amontoado para ganhar a disputa e, depois, dividir o poder. Não é um condomínio, mas um cortiço, em que cada casa de cômodo segue as suas próprias regras. A realidade política brasileira, reitero, com suas dezenas de partidos e uma espantosa indefinição ideológica, já predispõe o país à corrupção. O “modelo Lula” leva isso ao paroxismo.
O PR e o PMDB, por exemplo, estão magoadíssimos e prometem retaliação - se possível, “retalhação” também… - a quem queira ouvir. Sentem-se traídos. Não foi isso o que Lula lhes prometeu. Não é esse o acordo, vamos dizer, histórico feito com o PT. Afinal, o combinado é que cada um tenha o “seu” pedaço, desde que colabore, é evidente, com o governo federal.
ATENÇÃO! ESSES PARTIDOS PROMETERAM FIDELIDADE AO GOVERNO, NÃO VERGONHA NA CARA! ISSO NÃO ESTAVA NO COMBINADO. ISSO NÃO ESTAVA NO PREÇO. E não que o PT esteja fazendo tais exigências, entendam bem. Mas essa imprensa, vocês sabem como é… Se bem se lembram, Gilberto Carvalho, secretário-geral da Presidência, afirmou que ela não contribui para a “formação cidadã” - ou porcaria do gênero.
A pouca-vergonha a que assistimos é a expressão do mais puro modo lulista de conduzir a política. Os larápios saltaram da margem para o centro do poder. Passaram a dar as cartas em ministérios. E, como se conclui da reunião havida no Rio, Lula tenta dar sobrevida ao modelo. Continua disposto a juntar todos os “patriotas” numa grande frente para tomar de assalto as cidades. Depois é só dividir o conteúdo do cofre. O presidencialismo de coalizão pode até colaborar com a governabilidade. Já o lulismo de coalizão está desgovernado.
Por Reinaldo Azevedo